Hipófise e Nódulos Hipofisários: A Glândula Mestra e Seus Desafios

A hipófise, frequentemente chamada de "glândula mestra", é pequena em tamanho, mas gigante em sua importância para a regulação do corpo. Quando nódulos se formam nessa glândula, uma série de disfunções hormonais ou sintomas de compressão podem surgir.
Nesta seção, o Dr. Ricardo Amim da Costa detalha o que é a hipófise, seus nódulos, seus impactos e tratamentos.
A hipófise é uma pequena glândula considerada de suma importância para a sobrevivência do nosso organismo, por isso é conhecida como "glândula mãe".
- Localização: Situa-se no centro do crânio.
- Função: Produz diversos hormônios que controlam o funcionamento de quase todas as glândulas endócrinas do nosso organismo.
A hipófise é dividida em duas partes principais, cada uma com suas funções:
- Neuro-Hipófise:Produz e armazena os hormônios:
- Ocitocina
- Vasopressina (ou Hormônio Antidiurético – ADH)
- Adeno-Hipófise (ou Hipófise Anterior):Produz os hormônios:
- TSH (Hormônio Estimulador da Tireóide)
- LH (Hormônio Luteinizante)
- FSH (Hormônio Folículo Estimulante)
- ACTH (Hormônio Adrenocorticotrófico, estimulante das glândulas suprarrenais)
- GH (Hormônio do Crescimento)
- Prolactina
2. O Que é um Nódulo Hipofisário?
Um nódulo hipofisário é um crescimento anormal que afeta a glândula hipófise. A grande maioria desses nódulos são benignos, sendo chamados de adenomas hipofisários.
- Características: Podem ou não secretar hormônios em excesso, ou, por sua vez, podem inibir a função normal dos hormônios da hipófise.
- Prevalência: É a terceira maior causa de neoplasia intracraniana, perdendo apenas para os gliomas e os meningiomas.
Classificação dos Nódulos Hipofisários:
São classificados principalmente de acordo com o tamanho e a produção hormonal:
- Microadenomas: Nódulos menores ou iguais a 1 cm.
- Macroadenomas: Nódulos maiores que 1 cm.
2.2. Quanto à Produção Hormonal:
- Funcionantes (ou Secretores):Secretam hormônios em excesso, como:
- Prolactinomas (secretores de Prolactina)
- Adenomas secretores de GH (Hormônio do Crescimento)
- Adenomas secretores de ACTH (Hormônio Adrenocorticotrófico)
- Adenomas secretores de TSH (Hormônio Estimulador da Tireóide)
- Não Funcionantes (ou Não Secretores): Não secretam hormônios em excesso.
2.3. Importância da Classificação:
A classificação do nódulo é fundamental para o planejamento do tratamento e acompanhamento, definindo a abordagem mais adequada (cirúrgica, tipo de cirurgia, medicamentosa, expectante, etc.).
3. Sintomas dos Nódulos Hipofisários
3.1. Nódulos Assintomáticos (Incidentalomass Hipofisários):
Em muitos casos, uma pessoa com nódulo hipofisário não sente nada, especialmente se o nódulo for pequeno e não produzir hormônios em excesso. Nesses casos, o diagnóstico é feito por acaso, durante exames de imagem do crânio (RX, tomografia, ressonância) realizados para investigar outras condições. A esses nódulos damos o nome de "incidentalomass hipofisários".
3.2. Sintomas Causados por Nódulos Não Secretores de Hormônios:
Quando presentes, os sintomas de um nódulo não secretor geralmente são de dois tipos:
A. Sintomas de Déficit de Hormônios (por compressão da hipófise):
O nódulo pode comprometer o funcionamento normal de partes da hipófise, causando deficiência de hormônios:
- Hormônio do Crescimento (GH): É o hormônio mais comumente afetado. Em crianças, pode causar deficiência de crescimento. Em adultos, associa-se a diminuição da resistência aos exercícios, adiposidade central e alterações de humor.
- Gonadotrofinas (LH e FSH): Causam distúrbios menstruais (até ausência de menstruação) e infertilidade em mulheres; diminuição da libido, rarefação de pelos e diminuição do tamanho dos testículos em homens.
- TSH: Pode levar a hipotireoidismo secundário.
- ACTH: Resulta em fraqueza, falta de apetite, perda de peso, náuseas, vômitos e hipotensão arterial.
B. Sintomas de Efeito de Massa (por compressão de estruturas vizinhas):
O nódulo, ao crescer, pode comprimir estruturas próximas à hipófise, causando:
- Dor de cabeça.
- Perda de parte ou toda a visão (por compressão do nervo óptico).
- Náuseas, vômitos, e alterações na consciência (em caso de acometimento do 3º ventrículo).
- Fome excessiva, regulação térmica anormal e alterações na consciência (quando há acometimento do hipotálamo).
- Alteração nos movimentos dos olhos, queda temporária da pálpebra e dor facial (quando acomete os nervos dos olhos).
- Sangramento nasal.
- Crises convulsivas.
4. Tipos Específicos de Adenomas Hipofisários Funcionantes
4.1. Prolactinoma (Adenoma Secretor de Prolactina):
- Definição: Nódulo na hipófise que produz excesso do hormônio prolactina.
- Microprolactinoma: Menor que 1 cm.
- Macroprolactinoma: Maior que 1 cm.
- Incidência: Atinge 10 vezes mais as mulheres que os homens, com pico de ocorrência na 2ª e 3ª década de vida.
Sinais Clínicos do Prolactinoma:
- Em Mulheres:
- Galactorreia (secreção leitosa nas mamas, não associada à amamentação).
- Irregularidade no ciclo menstrual (até amenorreia – falta completa da menstruação).
- Infertilidade.
- Secura vaginal.
- Dor durante o ato sexual.
- Diminuição do apetite sexual (libido).
- Tendência à osteoporose.
- Em Homens:
- Impotência ou diminuição da potência sexual.
- Diminuição do apetite sexual.
- Diminuição do volume do líquido espermático.
- Infertilidade.
- Galactorreia (em apenas 30% dos casos).
Diagnóstico Laboratorial:
- Feito pela dosagem do hormônio prolactina.
- Dosagens entre 150 a 200 ng/ml: Geralmente indicam microprolactinoma.
- Dosagens maiores que 200 ng/ml: Indicam macroprolactinoma.
- Dosagens entre 25 a 150 ng/ml: Indicam hiperprolactinemia, mas outras causas não tumorais (medicamentos, estresse) ou até mesmo pseudoprolactinomas (nódulos não secretores que comprimem a haste hipofisária, elevando a prolactina de forma não significativa) devem ser investigadas.
Tratamento dos Prolactinomas:
- Primeira Opção (Medicamentosa): Uso de medicamentos via oral chamados agonistas dopaminérgicos. Geralmente são muito eficazes em reduzir os níveis de prolactina e o tamanho do tumor.
- Segunda Opção (Cirúrgica): Se não houver resposta aos medicamentos ou se o nódulo estiver comprometendo estruturas importantes devido ao seu tamanho, a cirurgia (transesfenoidal – via nasal – ou craniana) é considerada.
- Terceira Opção (Radioterapia): Em casos refratários ou quando a cirurgia não é possível.
4.2. Adenoma Secretor de GH (Hormônio do Crescimento):
- Definição: Nódulo que acomete as células da hipófise que produzem GH.
- Incidência: Pico de aparecimento entre a 4ª e 5ª décadas de vida, sem diferença significativa entre os sexos.
Sintomas do Nódulo Secretor de GH:
- Em Adultos: Acromegalia – aumento das extremidades ósseas (mãos, pés, nariz, orelha, queixo, testa) e alterações faciais evidentes (alargamento do nariz, língua, gengiva, lábios inferiores; aumento dos espaços entre os dentes).
- Em Crianças: Gigantismo – crescimento excessivo de todos os ossos.
- Outros Sintomas:
- Sudorese excessiva.
- Problemas articulares.
- Aumento das vísceras (cardiomegalia, visceromegalia).
- Dores de cabeça.
- Aumento da co-secreção de prolactina.
- Aparecimento de pólipos no intestino grosso.
Diagnóstico Laboratorial:
- Dosagem de GH após teste oral de tolerância à glicose (75g).
- Níveis elevados de IGF-1 (Fator de Crescimento Semelhante à Insulina 1) para a faixa etária correspondente.
- Primeira Opção (Cirúrgica): A cirurgia transesfenoidal é o tratamento de escolha.
- Segunda Opção (Medicamentosa): Em caso de contraindicações cirúrgicas ou falha da cirurgia, usa-se medicamentos análogos da somatostatina.
- Terceira Opção (Radioterapia): Em casos selecionados.
4.3. Adenoma Secretor de ACTH (Hormônio Adrenocorticotrófico):
- Definição: Nódulo que acomete as células da hipófise produtoras de ACTH. O excesso de ACTH leva à produção excessiva de cortisol pelas glândulas suprarrenais, causando a Doença de Cushing.
- Incidência: Pico de acometimento entre a 3ª e 4ª décadas de vida, e ocorre de 5 a 8 vezes mais em mulheres.
Principais Sinais e Sintomas (Doença de Cushing):
- Obesidade predominantemente no tronco e abdome (obesidade central).
- Rosto cheio e arredondado ("fácies de lua cheia").
- Aparecimento excessivo de acne e pelos (hirsutismo).
- Aparecimento de estrias grossas e de cor avermelhada (principalmente no abdome, coxas e braços).
- Fraqueza muscular, mais evidente na parte superior dos braços e pernas.
- Aparecimento de manchas roxas na pele (hematomas) com facilidade.
- Alterações psiquiátricas (piora da memória, distúrbios de personalidade, psicoses).
- Alterações menstruais.
Diagnóstico Laboratorial:
- Dosagem de cortisol livre na urina (coleta de 24 horas).
- Dosagem de cortisol no sangue após uso de dexametasona na noite anterior (teste de supressão).
- Dosagem de ACTH maior que 10 pg/ml.
- Primeira Opção (Cirúrgica): A cirurgia transesfenoidal é o tratamento de escolha.
- Segunda Opção (Radioterapia): Em caso de contraindicação cirúrgica ou para complementar o tratamento.
- Terceira Opção (Medicamentosa): Medicamentos como o cetoconazol podem ser usados para controlar a produção de cortisol.
4.4. Adenoma Secretor de TSH (Hormônio Estimulador da Tireóide):
- Definição: Nódulo hipofisário que acomete preferencialmente as células da hipófise produtoras de TSH. O excesso de TSH estimula a tireóide a produzir hormônios em excesso.
- Sintomas de Hipertireoidismo:
- Tremores nas mãos.
- Palpitações cardíacas.
- Sudorese excessiva (calor).
- Intolerância ao calor excessivo.
- Perda de peso, apesar do apetite preservado ou aumentado.
- Agitação, ansiedade e insônia.
- Aumento do tamanho da tireóide (bócio) em alguns pacientes.
Diagnóstico Laboratorial:
- Dosagem sanguínea de TSH normal a alta (o que é paradoxal para hipertireoidismo primário, onde o TSH seria baixo).
- Dosagem de T4 livre normal a alta.
- Primeira Opção (Cirúrgica): A cirurgia de retirada do tumor por via transesfenoidal (nasal) é o tratamento de escolha.
- Segunda Opção (Medicamentosa): Medicamentos como a octreotide.
- Terceira Opção (Radioterapia): Em casos específicos.
5. Exame de Imagem Preferencial para Nódulos Hipofisários
- A Ressonância Magnética (RM) da sela turcica ou túrcica (região do crânio que abriga a hipófise) é o exame de imagem de eleição para diagnóstico e acompanhamento de nódulos hipofisários.
- Na ausência da RM, a Tomografia Computadorizada (TC) da sela turcica com injeção de contraste também pode fornecer informações importantes sobre essa região.
6. Por Que Tratar ou Acompanhar Nódulos Hipofisários Assintomáticos?
Mesmo que você não sinta nada, é crucial tratar ou acompanhar um nódulo detectado na região hipofisária.
Isso porque, mesmo não produzindo hormônios em excesso, esse nódulo pode crescer e ocasionar comprometimento de estruturas importantes da região, como:
- Nervos cranianos (especialmente o óptico, que afeta a visão).
- Artérias importantes.
- Estruturas ósseas e cerebrais adjacentes.
Quando o tratamento é postergado para fases mais adiantadas, devido ao acometimento dessas estruturas, o tratamento se torna mais difícil e perigoso, com maiores riscos de sequelas.